Processo durou 13 anos. Funcionário teve salário reduzido em 33% e, após fim de contrato, não recebeu FGTS.
Embaixada do Chile no Brasil foi condenada pela Justiça do Distrito Federal por desrespeitar a legislação trabalhista. Segundo a condenação, a embaixada reduziu o salário de um trabalhador em 33% e, após o fim do contrato, não depositou o FGTS.
O processo foi movido pelo funcionário Francisco Antônio Ribeiro, e durou 13 anos. Não cabe recurso.
O advogado trabalhista Rafael Rodrigues Oliveira, que defendeu o caso, estimou que a reposição salarial chegue a R$ 100 mil. O montante será calculado somente após o processo transitar em julgado, quando começar a fase de execução da sentença. O G1 aguarda resposta da embaixada.
Segundo a decisão judicial, o ex-funcionário trabalhou na delegação chilena por 12 anos e, durante este período, viu o contracheque diminuir. Pelo artigo 7º da Constituição Federal, o trabalhador tem direito à “irredutibilidade salarial, salvo disposto em convenção coletiva”.
Ribeiro disse à Justiça que foi contratado em 1992 como jardineiro e também passou pelas funções de garçom, vigia noturno e porteiro. Em 1996, ficou afastado por auxílio-doença e, quando retornou, foi “sendo readaptado em outra função” de salário mais baixo – que caiu de R$ 686 para R$ 459,38, em valores da época.
Em defesa, a embaixada alegou imunidade de execução e justificou a redução salarial pela “readaptação de função, já que o reclamante não tinha mais condições de exercer a função anterior”. A delegação disse que depositou regularmente o FGTS, exceto sobre o 13º salário de 2003.
“O que revela, além de um óbice [obstáculo] à pretensão equiparatória nessas condições, a impossibilidade de o empregador reduzir o salário do empregado readaptado.”
O processo começou a correr no Tribunal Regional do Trabalho (TRT) em 2005 e só foi concluído em março de 2018. O caso chegou a subir para o Tribunal Superior do Trabalho (TST), mas foi remetido de volta à primeira instância.
O período de embargos – quando as partes podem se manifestar no processo – foi encerrado em julho, o que significa que não há mais possibilidade de recurso.
Com isso, a embaixada fica obrigada a repor a perda salarial do ex-funcionário e a pagar todos os direitos (1/3 de férias, 13º salários, aviso prévio e FGTS com multa de 40%) com base no valor após a reparação salarial.
Execução incerta
Após 13 anos de tramitação na Justiça, o processo chegou à fase considerada a mais complicada pelo advogado de defesa: a de execução. “Como as embaixadas gozam de imunidade, não conseguimos agir da mesma forma como acontece com empresas privadas no momento em que se inicia a execução para obrigar a pagar os direitos.”
A brecha está em precedentes do TST que, segundo Oliveira, relativizam a imunidade e permitem considerar a penhora dos bens de embaixadas. Um exemplo é a defesa da ministra do trabalho Kátia Magalhães Arruda em julgamento de setembro de 2016 sobre a questão:
“O STF vem decidindo no sentido de que é relativa, e não absoluta, a imunidade de jurisdição de que goza o Estado estrangeiro frente aos órgãos do Poder Judiciário brasileiro nas causas de natureza trabalhista.”
Para o advogado, a penhora de bens é um caminho possível desde que eles não se destinem a atividades específicas da delegação. “Um carro que não é de uso do embaixador, obras de arte, móveis e artigos decorativos”, exemplificou.
No entanto, ele afirmou que a Justiça brasileira não tem poder para enviar oficiais ao interior das embaixadas para verificar bens passíveis de penhora.
“O desafio é descobrir os bens penhoráveis.”
‘Imunidade diplomática’?
Segundo o advogado Rafael Oliveira, o termo jurídico para o que popularmente se conhece como “imunidade diplomática” é, na verdade, “imunidade jurisdicional”.
Ele explicou ao G1 que a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) deve ser respeitada por qualquer embaixada sempre que um empregado for contratado em território nacional – mesmo que esta pessoa não seja brasileira.
“Agora, se o funcionário foi contratado no Chile, por exemplo, e depois, designado para trabalhar na embaixada do país no Brasil, aí ele ficará sujeito à legislação chilena.”
Essa matéria foi extraída na íntegra do portal de notícias G1 Por Luiza Garonce, G1 DF em 31/07/2018 16h51