JORNAL VALOR ECONÔMICO – 12.12.2005
Fernando Teixeira De Brasília
Sindicato busca cumprimento de legislação por representações estrangeiras
O Sindicato dos Trabalhadores em Embaixadas, Consulados, Organismos Internacionais do Distrito Federal (Sindnações) está tentando envolver Ministério Público do Trabalho (MPT), Itamaraty e até o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) na disputa pelo cumprimento da legislação trabalhista brasileira. Este ano, a entidade já enviou ao MPT denúncias de problemas trabalhistas em 30 embaixadas. Mas, segundo o sindicato, a denuncia é apenas uma amostra de um universo de seis mil trabalhadores distribuídos entre as 146 embaixadas no país, além dos funcionários de órgãos internacionais e consulados – são 55 em São Paulo.
Graças a uma interpretação flexível do conceito de “imunidade diplomática” esses órgãos passam ao largo de qualquer forma de coação do poder público brasileiro, inclusive do Judiciário. A Justiça do Trabalho reconhece a incidência da legislação trabalhista sobre as representações estrangeiras, mas resiste em executar os bens dos órgãos diplomáticos quando a sentença não é cumprida. Segundo dados do Sindnações, foram proferidas até agora 540 sentenças contra representações estrangeiras, mas nenhuma delas quitada. Para o presidente do Sindnações, Raimundo Luís de Oliveira, sem uma ameaça real de constrangimento financeiro, as embaixadas resistem em cumprir a exigência.
O Itamaraty tenta monitorar o cumprimento da legislação trabalhista por meio da Comissão Geral de Privilégios e Imunidades, e comunica oficialmente as representações com problemas. Segundo o ministério, há um perfil heterogêneo na forma como as embaixadas lidam com a questão, e para esclarecer o assunto deverá organizar no próximo semestre um seminário sobre o tema. O Brasil defende a aplicação da lei local pelo princípio da reciprocidade, pois cumpre a legislação trabalhista dos países onde está representado. Uma portaria de 2001 detalhou os procedimentos de gestão da mão-de-obra, exigindo o cumprimento da legislação dos países onde está representado e proibindo a alegação da imunidade de jurisdição.
Conforme o presidente do Sindnações, desde que entidade foi criada em 1998, as irregularidades vêm reduzindo. Ele estima que, na época, apenas 20% das embaixadas assinavam a carteira dos funcionários. Hoje cerca de 80% delas já cumprem a exigência. O problema, contudo, é que na maioria das vezes ainda não reconhecem o direito retroativo aos anos anteriores – como os depósitos de FGTS e contribuição previdenciária.
Em alguns casos os trabalhadores também conseguem fechar um acordo para quitar as parcelas pendentes – o que pode exigir alguma dose de pressão. Segundo Raimundo de Oliveira, um grupo de 11 ex-funcionários da Indonésia precisou ficar um ano e nove meses acampado na porta da embaixada, com direito a piquete e carro de som em datas especiais, até que fosse homologado um acordo. Depois de ocupar a liderança no ranking de ações trabalhistas, com 79 processos, a embaixada de Portugal acabou resolvendo suas pendências por meio de um acordo com 104 funcionários, fechado em fevereiro de 2004.
Uma boa briga na Justiça tem se mostrado também uma via eficiente para fechar uma saída negociada. No único precedente sobre o assunto, o Tribunal Superior do Trabalho (TST) suspendeu a penhora da conta corrente da embaixada da Malásia em uma execução, mas alguns juízes de primeira instância pensam diferente. O advogado responsável pelo caso da Malásia, Israel Nonato, já conseguiu a penhora da conta de duas outras embaixadas, e fechou acordo em uma delas. Ele diz que a Convenção de Viena, de 1961, que disciplina as relações diplomáticas, determina que a representação estrangeira siga a lei local. A mesma convenção protege os bens móveis, imóveis e os veículos utilizados pela representação estrangeira, mas não fala sobre as contas bancárias. Para o advogado, isso implicaria que esses recursos poderiam servir ao cumprimento das legislação.